quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Postagens dos poetas da Coletivoz

Jessé Duarte


Quem não viu vai vendo, e vem conferir de perto também.

Estaremos postando alguns poemas que estão sendo recitados no sarau, vou começar com um meu que falei lá essa quarta e logo à gente coloca mais. Espero que gostem.

Comentem.

O ultimo Domingo de Ana
Jessé Duarte

Manhã de um domingo qualquer, as pessoas caminham pelas ruas voltando da igreja e levando para casa o frango que reservaram na noite passada em uma venda que ainda vende frangos abatidos na hora. Abatida também é Ana, a vida para ela é complicada, 17 anos, mãe, desempregada, bolsa família atrasada, expulsa de casa pelo pai e sustentada pelo companheiro que por sua vez é sustentado pelo trafico, mas não é só Ana que vive essa realidade de abatedouro, são dezenas de moradores desse lugar.

Para Ana esse dia é diferente, sem saber o que lhe espera, como de costume nos domingos ela sai pelas ruas que começam largas e logo se estreitam e observa como se nunca tivesse observado em sua volta as portas trancadas ou quase sempre escoradas, carroças encostadas na beira de córregos a céu aberto, ausência de crianças nas ruas e com muito cuidado olha o boneco no ponto mais alto da vila, ele veste preto quanto algo esta para acontecer e dessa vez ele não esta nu, esta vestido de luto, sinal de perigo. Mas nada de anormal, tudo certo (para ela) como de costume.

Mesmo sabendo do perigo Ana continua seu percurso e senta-se à mesa de um bar, pede uma cerveja e tenta por um minuto pelo menos, esquecer da vida cotidiana, mas não consegue parar de pensar no que viu a alguns dias. pois sabe que tem coisas não deve-se ver. Nada a ver com cine Privê se o problema fosse esse, seria muito fácil de resolver.

De repente barulhos de tiros, correria para se esconder. Mas num instante todos correm para ver mais uma vida que se vai, em uma cadeira do bar da esquina do jeito que a pegaram Ana ficou. O dono do bar abaixou as portas, guardou todas as mesas e cadeiras deixando só a cadeira em que ela estava. A multidão se fez ao seu redor e às pessoas comentavam entre si:

- Ela ainda esta viva.
- Nossa! Foi um tiro na boca.

Enquanto isso ela continuava com sua cabeça pendurada na cadeira de plástico, com os olhos arregalados, respiração baixa e engasgando com o próprio sangue. Mas ninguém fez nada, ninguém a tocou e onde ela estava continuou, do jeito que estava ficou, do jeito que esperava engasgou. Porem não foi só ela, a mãe que estava de perto assistindo tudo amparada pelo filho mais novo, também engasgou em um choro mudo de dor ao ver filha morrer e não poder fazer nada.

Por que em um lugar chamado Vila da Paz, a paz é o que menos impera? E quanto a essa vida, ninguém faz nada a não ser assistir o seu fim? o que resta é isso então?

Sim. Nesse lugar a uma lei, diferente da lei do mundinho em que pessoas soltam balões brancos almejando a paz mundial, uma lei que é feita para quem esta disposta a viver com medo da paz. Pois a paz reina no dia seguinte até que novos disparos anunciem mais um dia de tranqüilidade, mais um dia de felicidade, mais um dia de vaidade para aqueles que não sabem de fato o que é a realidade.

Um comentário:

Aline Magalhães disse...

Pois é meu caro jesse! Muito bacana o poema que você postou e acho que tem muito haver com a cletivoz! Saber qe casos com esse Da "Ana" acontecem todos os dias em lugares do mundo todo... Calar a voz, calar a vida é revoltante! E existem tantas "Anas" por ai que é impossível quantificar e ainda que fosse, um só caso como este (Acreditem foi real e foi cruel) me parece suficiente para dispertar a fúria contra este Estado que não consegue garantir o mínimo de dignidade, mas ao contrário o que impera é o silêncio e o cotidiano de ver casos como este se tornarem comuns! E não me iludo que se calam por comodismo, porque cnvivier com o medo não deve ser cômdo, nem porque estão satisfeitos com a realidade(seria bizarro achar isto). E tô com o camarada Rogério quando fala que é necessário unir as vozes num só coletivo! Podem calar quantas vidas forem mas a voz coletiva dificilmente se cala com tiros!
É isso!! Parabnéns pela iniciativa e pela força!
Somos filhos da luta!!!!
À voz! À luta