sexta-feira, 13 de agosto de 2010

As Cores da minha rua

Rogério Coelho

As cores da minha rua estão mais escuras agora. Como se tivessem coberto todo o céu com um com um vermelho-carmim, e às árvores restaram refletidas luzes róseas , que o sol permite quando incide sobre as folhas lisas. O asfalto cinza tornou-se bege; minha casa azul, ficou roxa; e as pessoas todas vermelhas. De uma vermelhidão simples e serena – se é que isso é possível. Não é pela expressão dos rostos, mas pela conformidade do intenso vermelho que cai do céu. Estão em tons mais claros ou escuros os cidadãos. Os sons estão mais brandos também. Fazem com que a rua esteja mais lenta, e o tráfego arrasta os carros leves. As pessoas estão com medo de sair de casa. Os carros, às vezes, param de funcionar, e quando os seus donos os deixam eles voltam repentinamente; desgovernam-se os carros de modo comum e sem violência. Tudo aconteceu assim, no minuto seguinte em que resolvi me cegar com uma agulha de costura. Só consigo escrever sobre isso agora, que tenho calma para separar duas coisas: meu terror diante da vida e minha tentativa de nunca mais enxergar. Por que não morrer ao invés de me cegar? A idéia do suicídio era-me menos trágica do que furar os olhos, mas não tinha uma pena a cumprir. Deixando de enxergar eu veria um mundo diferente, sob outra perspectiva. O que me levaria a reeducar-me sobre o mundo. Confiava em meu instinto de mais respeito sobre as coisas. Iria demorar-me mais acariciando uma árvore, um animal qualquer, um rosto, uma voz tremida no entre lábio que meu avô desperta cada vez que fala devagar. Todas as coisas que são para se perceber. Além disso, procuraria uma nova visão Achei que não tinha mais nada pra ver aos 12 anos de idade. Morrer seria muito injusto, uma vez que eu poderia experimentar um mundo um pouco mais cruel: cego e pervertido por cores. Por sorte, a agulha vazou minha pálpebra e feriu de leve o branco maior dos olhos. Mais sangue menos sangue, decidi também não chorar. Se não ficasse cego, ao menos iria ver a transfiguração das cores; tudo se desfazendo em minha frente. As coisas em fim mudaria de tom. O dia mudaria. Mudou!

Minha casa era um lugar muito comum

post/ Kaká Pimentta

Nenhum comentário: